segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

NORONHA E SEUS FILHOS

FERNANDO AZEVEDO


Já escrevi aqui no blog sobre minha experiência de médico em Fernando Noronha.  Naquele tempo a ilha era federal e tinha um superintendente. Como não havia médicos residentes a cada sete dias seguia uma equipe com um clínico, um cirurgião/obstetra, um pediatra e um laboratorista. Foi uma das mais ricas experiências de minha vida médica. Nas minhas observações chamou atenção o primeiro dia de trabalho. Estava no ambulatório e ainda não sabia bem quais os medicamentos que a farmácia possuía e expliquei para a mãe minhas dificuldades iniciais. Aí veio a pancada: - Doutor pode passar o que quiser que eu tenho parentes no Brasil e eles me mandam. Onde eu estava então?Outra coisa que anotei foi o orgulho de ser ilhéu, nativo como eles diziam.  O Dr.Domício, supervisor da área de saúde na ilha falava que pertencia à terceira geração de ilhéus. Salvo engano tudo começou com seu avô ou bisavô, não tenho uma certeza, mas todos os ilhéus exaltavam esse orgulho. Voltei sem nunca mais querer pisar naquele solo, pois sei que jamais seria como foi e queria deixar aquela indelével memória na minha cabeça. Vejo agora em reportagem do Diário de Pernambuco que há NOVE ANOS não nasce um nativo. No sétimo mês a mulher grávida é transferida para o Recife para ter seu filho em segurança. Nasce a criança no Recife, mas recebe uma certidão que é noronhense. Esquisitíssimo, pois é uma certidão falsa. Pela lei uma criança não pode nascer sem assistência de um neonatologista. Foi uma luta a classe pediátrica conseguir esse feito para melhor assistência aos neonatos que eram muito mal cuidados. Isso traz dificuldades, pois teria que haver na ilha no mínimo dos mínimo oito ou nove neonatologistas residentes, pois nem sempreoos bebês nascem bem e precisam e cuidados intensivos. Sei das dificuldades de administrar essa situação, mas onde fica o emocional dessas mães que no sétimo mês de gestação são deportadas? Como fica a amamentação? Quando passei por lá o índice era de 100% praticamente. Todos os bebês saiam do peito para o peixe. Eram as proteínas disponíveis afora um bodinho. Não havia supermercados nem opções outras de consumo. Com o turismo intenso para a ilha ficam os viajantes também sem proteção. A ilha é paradisíaca. Será que não interessaria a médicos jovens uma passagem por lá? Hospital minimamente estruturado e hotelaria para recebê-los em sistema de rodízio com um salário de cubano (pagamento integral ao médico).  Não é fácil, pois aqui nas nossas barbas não tem médico interessado em trabalhar. Inegavelmente o mundo já foi melhor, com mais solidariedade e humanismo.

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