FERNANDO AZEVEDO
Já escrevi aqui no blog sobre minha experiência
de médico em Fernando Noronha. Naquele
tempo a ilha era federal e tinha um superintendente. Como não havia médicos
residentes a cada sete dias seguia uma equipe com um clínico, um
cirurgião/obstetra, um pediatra e um laboratorista. Foi uma das mais ricas
experiências de minha vida médica. Nas minhas observações chamou atenção o
primeiro dia de trabalho. Estava no ambulatório e ainda não sabia bem quais os
medicamentos que a farmácia possuía e expliquei para a mãe minhas dificuldades
iniciais. Aí veio a pancada: - Doutor pode passar o que quiser que eu tenho
parentes no Brasil e eles me mandam. Onde eu estava então?Outra coisa que
anotei foi o orgulho de ser ilhéu, nativo como eles diziam. O Dr.Domício, supervisor da área de saúde na
ilha falava que pertencia à terceira geração de ilhéus. Salvo engano tudo
começou com seu avô ou bisavô, não tenho uma certeza, mas todos os ilhéus
exaltavam esse orgulho. Voltei sem nunca mais querer pisar naquele solo, pois
sei que jamais seria como foi e queria deixar aquela indelével memória na minha
cabeça. Vejo agora em reportagem do Diário de Pernambuco que há NOVE ANOS não
nasce um nativo. No sétimo
mês a mulher grávida é transferida para o Recife para ter seu filho em
segurança. Nasce a criança no Recife, mas recebe uma certidão que é noronhense.
Esquisitíssimo, pois é uma certidão falsa. Pela lei uma criança não pode nascer
sem assistência de um neonatologista. Foi uma luta a classe pediátrica
conseguir esse feito para melhor assistência aos neonatos que eram muito mal
cuidados. Isso traz dificuldades, pois teria que haver na ilha no mínimo dos
mínimo oito ou nove neonatologistas residentes, pois nem sempreoos bebês nascem
bem e precisam e cuidados intensivos. Sei das dificuldades de administrar essa
situação, mas onde fica o emocional dessas mães que no sétimo mês de gestação
são deportadas? Como fica a amamentação? Quando passei por lá o índice era de
100% praticamente. Todos os bebês saiam do peito para o peixe. Eram as
proteínas disponíveis afora um bodinho. Não havia supermercados nem opções
outras de consumo. Com o turismo intenso para a ilha ficam os viajantes também
sem proteção. A ilha é paradisíaca. Será que não interessaria a médicos jovens
uma passagem por lá? Hospital minimamente estruturado e hotelaria para
recebê-los em sistema de rodízio com um salário de cubano (pagamento integral
ao médico). Não é fácil, pois aqui nas
nossas barbas não tem médico interessado em trabalhar. Inegavelmente o mundo já
foi melhor, com mais solidariedade e humanismo.
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