segunda-feira, 24 de junho de 2013

INTERIOLOGIA E ESPECIALIZAÇÃO



FERNANDO AZEVEDO

Conta-se que um homem com uma forte dor no testículo esquerdo seguiu a orientação de um amigo e procurou um especialista num edifício empresarial. Confundiu a porta e entrou num escritório de advocacia. A secretária que o recebeu perguntou do que se tratava e ele relatou:- Estou com uma forte dor no testículo esquerdo. Ela com toda razão respondeu: - Senhor aqui só tratamos de Direito. Desesperado o homem responde: -Vai ser especializado assim na p.q.p.
O exemplo ilustra muito bem um dos pecados da formação médica atual, e que resulta numa tragédia assistencial que se espalhou por todo o Brasil e que não sei mais onde é a porta de saída, só sei que “trazer milhares de médicos estrangeiros” como disse em cadeia nacional a presidentA é uma insanidade. Estou há 50 anos praticando Medicina. A formação dos médicos mais antigos e que influenciou nossa geração foi a de um conhecimento amplo, os chamados generalistas. Nada contra os especialistas porque eles são extremamente necessários e da maior importância para o desenvolvimento e conhecimento dos sistemas anatômicos, mas não pode cair naquela de “especialista é aquele que sabe tudo sobre quase nada e não sabe nada sobre quase tudo”. A crise da assistência médica em cidades do interior existe, sobretudo porque os INTERIOLOGISTAS foram extintos, os hospitais faliram e não há a menor possibilidade de atrair um novato. O interiologista era um médico da maior importância e a ciência uma das mais difíceis. Ele era obstetra de partos fáceis e difíceis, pediatra, clínico geral e cirurgião para não ir mais além. O interiologista era formado nas maternidades e pronto socorros e ali ele operava uma apendicite, retirava uma vesícula, um baço, suturava intestinos perfurados a bala e furados por faca. Atendia fraturas. Morava nas cidades do interior, fazia seu nome, seu patrimônio, e a população o idolatrava. Conheço dezenas de colegas inclusive muitos de minha turma de formatura. Quando fui para o Rio de Janeiro fazer residência conheci jovens de todo o Brasil e que voltaram para seus rincões. O que acontece hoje é que a especialização é muito precoce por uma questão de mercado. Na Pediatria por exemplo temos a neonatologia, gastroenterologia, pneumologia, alergologia, endócrino, cardiologia, dermatologia  e dispenso seguir a lista, e os concursos são também focados nas especializações. Não pode uma cidade de interior ser equipada com tantos especialistas e sem mercado eles ficam nas capitais e cidades de grande porte. Vocês não imaginam  (porque não conheceram) a importância das parteiras no Recife e no interior. Como acabar com essa classe que tantos serviços prestou e poderia continuar prestando. Todas as maternidades tinham as suas, e falo de maternidades privadas.Quando trabalhei em urgências pediátricas drenei dezenas (acho que centenas) de tóraxes com empiema e pneumotórax. No Oswaldo Cruz onde trabalhe por 10 anos fiz traqueotomias, dissecção de veias periféricas, axilares e femorais salvando crianças de morte iminente por difteria e tétano. Não havia cirurgiões disponíveis e tive que aprender e ensinar. Não meus brasileiros e brasileiras, cada país tem que fazer suas adaptações, mas daqui que um cubano entenda que “piriquita chorando, formigueiro no furico, é uma vulvovaginite e uma oxiuríase a criança já tirou as calças pela cabeça. Vamos esperar pelo sucesso da importação. Para quem é provinciano e patriota como eu, da uma pena danada ver nosso país nas manchetes do mundo  exportando mercadoria tão assombrosamente negativa. A essa altura pra que copa se precisamos de cozinha.

segunda-feira, 17 de junho de 2013

PREDSIMZINHO

FERNANDO AZEVEDO

Vocês não imaginam o que era tratar um asmático há 50 anos. Xaropes e nebulizações com drogas cheias de efeitos colaterais, naquela de “o remédio mata mais que a doença”. Era esperar uma nova crise e novamente o mesmo arsenal terapêutico. Natação era a grande arma para o exercício pulmonar e muitos nadadores olímpicos foram asmáticos na infância e se tornaram grandes atletas. Muitos, no entanto não tinham a menor vocação esportiva ou mesmo pioravam com rinites, otites etc. Sabe-se hoje que o esporte em geral pode beneficiar muito o asmático, mas sob orientação. Esportes de explosão muitas vezes desencadeiam crises. É a chamada asma de esforço que acontece também quando um asmático ri muito (gargalhadas mesmo). Temos hoje o Pilates como uma excelente arma para o trabalho de fisioterapia pulmonar. Pilates era um asmático (leiam no Google- coloquem Pilates e asma)
Hoje a industria farmacêutica nos oferece uma série de medicamentos eficazes e bem tolerados e entre essas drogas está a Prednisolona que é um corticoide que se usa em crises agudas por 3 a 5 dias ou em raras ocasiões em esquemas mais prolongados.” Quando se receita corticoide a mão deve ficar trêmula” já disse um médico antigo que não recordo o nome. Diz-se também que o corticoide é ótimo para o médico (seu conceito como milagreiro vai lá para cima) para o paciente (que se vê livre do mal estar também em breve tempo) e para a doença (para quem ele abre as portas por diminuir a reação imunológica)
Acontece agora que esse corticoide (Predsim, Prelone – os mais conhecidos) está sendo conhecido pela população leiga como se fosse um xarope. É comum o uso em qualquer tipo de tosse esse uso indevido.
- Eu venho dando a ele um PREDSIMZINHO, mas não está melhorando.

Muitos desses quadros respiratórios são infecciosos, pneumonias etc. e só se auscultando e examinando a historia pode ser receitado. Tenha esse cuidado. Asmáticos devem tê-lo sempre em casa, levar para viagens, assim como “as bombinhas” de bronco dilatador para tratamento precoce da crise, mas logo a criança deve ser examinada para conferir se realmente é uma crise asmática.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

O SOM DOS CHOROS

FERNANDO AZEVEDO


“Pediatria deve ser muito difícil porque a criança não fala” esse é um comentário comum. Verdadeiro. Aliás, medicina é muito difícil. Entender o organismo animal (incluo a Veterinária) é complicado, a interação dos diversos sistemas atrapalha o médico e o paciente. Muitas doenças na pele, por exemplo, são exteriorizações de patologias em outros órgãos. Tem ainda as doenças psicossomáticas que derrubam muitos pensamentos apressados. Uma coisa na criança é vantajosa. Ela é pura, sincera, não mente e com sua expressão facial revela alegria, tristeza, dor. Ai você pergunta: E o recém-nascido e criança pequenininha? Além da face o choro é música pura. A fome tem um som, a dor outro sempre em tons maiores. A tristeza o abandono em tom menor. As rugas, o franzir da testa compõem o quadro. Quem melhor entende o choro? A mãe. Nós desconfiamos, mas o aval delas é fundamental. Quero abordar, no entanto o choro noturno que sempre é interpretado como fome e lá vem mamadeira desnecessária e a engorda. Nos primeiros meses a criança da trabalho, o primeiro então nem se fala. É um organismo em crescimento intenso e precisa combustível, mas a partir do quinto mês, por exemplo, muitas já dormem a noite toda. Pelo som veja se tem som de fome ou de desconforto que pode ser uma ma posição, algum incômodo, frequente em área de fraldas, calor, frio, nariz entupido, tosse. Com esse choro noturno cria-se um raciocínio que “para não acordar dou uma mamadeira quando está dormindo, pois não vai despertar com fome” Terrível engano, vômitos frequentes, refluxos, despertar sem fome e com isso não se interessa por outra alimentação seguindo a tomar mamadeiras durante o dia todo. As famosas cáries de mamadeira aparecem e a dentição se prejudica. A partir do quinto mês, experimente depois de verificar tudo, tentar se um chá ou água não resolve. Se for fome mesmo paciência, cada um tem seu ritmo, mas a obesidade começa a ser combatida  com essas pequenas ações.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

MITOS

FERNANDO AZEVEDO


Essas coisas se perpetuam. Quando eu era criança no Espinheiro, morreu o Padre Silvino pároco da igreja e a noticia correu solta pelo bairro. Era beata chorando e aquela confusão. Mas morreu como, se o homem estava bonzinho e rezou a missa de manhã? “ - “Porque fez a barba depois do almoço e deu congestão”, era a verdade imposta e aceita. Depois quando foram tirar os ossos outro boato se espalhou pois o esqueleto estava virado e portanto talvez tivesse sido enterrado vivo pois nesses casos de congestão nem sempre o morto está morto mesmo. Tomar banho depois do almoço Nem pensar. Duas horas no mínimo para fazer a digestão. E o banho se estivesse com febre? Morte certa com pneumonia e basite. Quando eu percebia que algo não ia bem, tomava logo um banho, pois se tivesse febre só ia para o banho de cuia depois de passar 24 horas sem febre. A casa ficava toda fechada (não havia chuveiro elétrico) e um caldeirão de água fria era temperado por uma chaleira de água fervendo até ficar com água morna. O banho de cuia era dado e existiam umas cuias sofisticadas próprias para o ato.Já aos 25 anos como médico residente no Rio de Janeiro num calor de 50 graus resolvi que ou morreria de congestão ou do calor insuportável. Entrei no chuveiro e quase 50 anos depois estou ainda vivo e por implicância só tomo banho depois do almoço. Vingança!Tenho uma prima que ainda hoje não lê nada logo depois de uma refeição. Derrame cerebral iminente se cometer essa insanidade. E fruta que tem visgo? como manga, sapoti. Se tomar leite se arrebenta . Não demora 24 horas vivo. Hoje com as piscinas, hotéis, churrascos ninguém espera “fazer a digestão” e não há registro de óbitos nessas festas, mas os tabus continuam. Existem muitos casos de mortes em motéis e isso é verdadeiro e atribuem a transa depois de comer (comida), mas não tem nada a ver, são enfartes devido à emoção, e bota emoção nisso.