segunda-feira, 26 de agosto de 2013

O ARTISTA E A ESTRADA

FERNANDO AZEVEDO

Lembro muito bem da morte de Francisco Alves em 1952. O Brasil perdia o seu maior cantor, o Rei da Voz. Acidente automobilístico na Rio-São Paulo, estrada muito usada pelos artistas da época que se apresentavam nas duas cidades, ou mesmo como Antonio Maria que começava uma farra no Rio e terminava na Paulicéia. Luiz Gonzaga, o nosso Rei do Baião quase se foi numa madrugada enluarada no Rio de Janeiro. Outra morte que parou o Brasil foi a de Maysa Matarazzo na ponte Rio-Niteroi em 1977. A cena continua aberta para novos artistas que, sobretudo em início de carreira são vítimas de empresários que o programam numa mesma noite em várias cidades atravessando a madrugada em shows e voltando com todo o grupo em vans de aluguel ou mesmo dirigindo seu próprio carro. O sono, o cansaço e muitas vezes o álcool companheiro obrigatório para manter-se aceso o tempo todo roubam a vida do ídolo que deixa sua plateia inconsolável. A volúpia de ganhar dinheiro, aproveitar a fase que atravessa e aceitar compromissos estafantes são iscas nada boas, mas o artista cai. Os automóveis cada vez mais seguros com cintos de segurança e outros apetrechos dão certo grau de confiança, mas as estradas são geralmente deploráveis por todo o Brasil com buracos e animais que na noite não são vistos. Independente de compromissos artísticos a vida pessoal boêmia que faz parte da alma dos que fazem a noite expõe o artista também no seu dia-a—dia. A lei seca não funciona nesses casos, pois a certeza que nada vai acontecer predomina. Nenhuma lei, nenhum contrato regularia essa proibição de vagar pelas ruas e pelas estradas. Perder um artista é uma pena. Não existe faculdade de artistas nem vestibulares com milhares de inscritos. Não, a arte não é para todos, é um prêmio que cada um recebe não se sabendo por qual mérito. Ele nasce pronto, é só desenvolver sua habilidade e zelar por ela. O povo é seu combustível, o aplauso seu alimento, o palco sua vida. Zelem por ela!

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

MEU FILHO É UM GÊNIO

FERNANDO AZEVEDO


Vou vender o peixe pelo mesmo preço que comprei. Um querido amigo me relatou uma vez que outro seu amigo tinha um filho que ele considerava um gênio. E relatava na roda de convivência que ficava bobo com a inteligência do filhote, que era bom em tudo, que aprendeu a ler muito rápido e isso e aquilo. Notava também que o filho já não tinha companhia porque não se interessava pelas conversas das outras crianças. Resolveu então leva-lo a um psiquiatra infantil muito famoso que era seu amigo para saber como abordar o caso. Na primeira consulta já veio a conclusão do colega: - João teu filho não tem nada de gênio, ele é CHATO. A história vem à propósito de um artigo interessante sobre esse rótulo que é muito comum. O elogio quase que permanente à inteligência do filho faz com que a consciência da própria inteligência não ajude a criança. Ele começa a dividir o mundo naquilo que ele é bom e naquilo que não é bom. –“Ah se não sou bom para soletrar vou fazer o próximo exercício” tendo como estratégia de vida buscar o prazer e evitar a dor. Depois começa a descrer de suas próprias habilidades subestima a importância do esforço e superestima a necessidade de ajuda dos pais. Um teste realizado nos EEUU com mais de 400 crianças da quinta série desafiava meninos e meninas a fazer uns quebra-cabeças relativamente fáceis. Ao fim alguns eram elogiados pela sua inteligência (“você foi bem esperto heim!) e outros pelo esforço (“ puxa, você se empenhou pra valer heim!). Em outra rodada, mais difícil, os alunos podiam escolher entre um novo desafio semelhante ou diferente. A maioria dos que foram elogiados como “inteligentes” escolheu o desafio semelhante. A maioria dos “esforçados” escolheu um desfio diferente. Então as crianças devem ser sempre elogiadas pelo seu esforço em progredir e não exaltadas pela inteligência que possuem. Fica a dica. “Celebre o sucesso, mas não se esqueça de comemorar também o fracasso seguido de nova tentativa”.

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

NO MEU TEMPO NÃO ERA ASSIM

FERNANDO AZEVEDO

Não tive a felicidade de conhecer avós a não ser minha avó paterna já idosa e sem paciência com crianças. Era uma grande pianista e com sua arte ganhou o necessário para sustento dos filhos tocando no tempo do cinema mudo, em outros eventos e ensinando. Sorte das crianças que aproveitam seus avós, categoria à qual pertenço há 20 anos. Estamos naquela de ajudar no que for preciso, ficar em casa hospedando netos para que o casal vá a um cineminha etc. e até torcendo para que essas sessões sejam frequentes. Não concordo com a famosa plaquinha “na casa da vovó pode tudo”, mas aceito o “quase tudo” porque temos que contribuir com a educação dos pimpolhos, mas sempre com o coração mais brando, sem desgaste, para que a convivência seja a mais harmoniosa e a lembrança dos velhos a melhor possível. A vida de hoje está complicando essa relação e a disponibilidade não é mais abundante, pois a terceira idade voltou ao mercado ou trabalhando ou se divertindo e, sobretudo viajando. É impressionante a quantidade dessa turminha em aeroportos e, sobretudo nos navios. Nosso tempo foi bom. Infância despreocupada, juventude gostosa sem os medos de hoje. Isso a gente pode comparar e ganha. Outras não da. Dentista por exemplo era terrível, brocas inesquecíveis, traumas até hoje. Viagem de avião a hélice que tal? No quesito automóvel é um abismo. Na medicina o avanço é inesgotável em técnicas cada dia mais elaboradas. Cirurgias endoscópicas, stentes, transplantes, imagens, diálises, UTI, (embora a assistência médica esteja um caos) não permite um termo de comparação. As crises de asma que tanto maltratavam as crianças (e matavam) eram tratadas com xaropes péssimos e mezinhas. Comprar um cancão (pássaro da caatinga que se dizia atrair a asma para si, livrando a criança) era uma providência muito usada. Hoje temos muito mais possibilidades. Então vovós não pensem em reeditar o Vick Vaporub no pé calçando uma meia depós, o álcool no pescoço e no corpo para baixar a febre, inseticida para matar piolho (Neocid em pó) e outras coisas que ficaram para trás de vez. “No meu tempo se usava”! Tudo bem, mas esse tempo passou.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

A DROGA LÍCITA E AS ILÍCITAS

FERNANDO AZEVEDO


Não quero dar desculpas, mas esclarecer uma cosia sobre drogas. Todos os setentões merecem perdão por terem entrado pra valer em álcool e cigarro. Vocês não podem imaginar o que o pós-guerra com os cowboys americanos tomando uísque puro (daí o nome de cowboy a quem toma uísque assim) e mostrando sua valentia e pontaria com o revolver (outro mal muito usado) os grandes conquistadores tomando uísque “on the rocks”, vinhos e champanhes tragados em festas deslumbrantes. O cigarro no canto da boca característica dos valentes ou nas piteiras dos elegantes era irresistível. Medicamentos a base de álcool para as crianças inapetentes (eu adorava um tal de Glimiton) ou um cálice de vinho do porto com uma gema crua deixando uma leve sensação de embriaguez tornava a falta de apetite um troféu. Os malefícios do álcool e cigarro eram totalmente escondidos se é que eram realmente conhecidos. Conversando com primos de minha idade, relatava um deles que meu tio dava como presente de 18 anos um pacote de cigarros e um isqueiro. Hoje cai nessa quem for ignorante. Uma semana de fumo cria dependência. O álcool como hoje é tomado, diariamente, pois as escolas estão rodeadas de bares e as festas são contínuas principalmente nas férias tem criado dependentes com muita frequência e fico impressionado com isso. DROGA LÍCITA. Lícita porque traz grandes lucros ao país, mas não lembram os males e gastos com a saúde além do fracasso social e familiar do dependente. DROGA ILÍCITA, essa é terrível porque você tem que compra-la na moita, no submundo com dependência química mais forte ainda e mais rápida. É assombroso seu aumento entre os jovens muitos deles associados como patrões do tráfico e infiltrando-se na classe média e alta o que evita o contato dessas pessoas com os marginais, polícia etc. Escrevo como ex-fumante que entre 30 e 40 anos abandonou o cigarro com um trabalho de conscientização. Sabia eu como médico dos males dessa droga lícita. Não foi nem é fácil largar. Mantive minha cervejinha diária noturna até que uma pancreatite me deu um aviso grave para parar. Virei “pastor” como me chamam e ainda é mais difícil largar o copo que o cigarro, pois a toda hora e em qualquer lugar você é convidado para uma dose. O fumante hoje não é aceito, incomoda, mas o abstêmio tem que segurar as pontas pra não cair na tentação.