segunda-feira, 28 de abril de 2014

MEDICINA E DIREITO

FERNANDO AZEVEDO

Fiz meu curso médico há mais de 50 anos atrás. Entrei em 1959. Durante todo ele, aulas de Medicina nos seus vários aspectos, mas nenhuma palavra sobre Direito. Sempre que se abrem inscrições para concurso público me inscrevo não para assumir o emprego, mas para fazer uma autoavaliação contínua, pois não podemos jamais fechar o livro. Fui aprovado em todos que fiz graças ao esforço que faço para atender ao conteúdo da prova, sempre muito “teóricas” empulhativas e difíceis. Quando chego é comum a surpresa dos jovens. – Veio fiscalizar Dr. Fernando? – Não vim fazer! Saio sempre sem saber a quantidade de acertos pois não há divulgação de gabaritos, mas o que me espanta é o conteúdo de aproximadamente 20 a 30% de área jurídica na prova. O médico hoje está exposto a tantas responsabilidades que um deslize que para ele pode até ser pequeno, representa uma possibilidade de fim de carreira. Nós Pediatras temos que mesmo sem vocação para leituras dessa área, conhecermos ou no mínimo consultarmos o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Código de Direito do Consumidor, Código civil, Código Penal, Leis do Conselho Federal de Medicina, do Conselho Regional de Medicina para que em diversas situações não cometamos erros que possam aniquilar nossa carreira além do prejuízo financeiro às vezes impagável. Como pequenos exemplos: Uma adolescente de 10 anos se apresenta grávida numa consulta. Teria ela direito a fazer o aborto? Quem autorizaria, um juiz ou pode ser uma decisão médica? Um pai se nega a fazer vacinação nos filhos: o que o Pediatra deverá fazer? Um Testemunha de Jeová não permite uma transfusão de sangue no seu filho. E daí? Um médico ao fim do seu trabalho apresenta seus honorários ao cliente e ele recusa pagar. Que leis lhe protegem ou lhe punem por não ter feito um acordo prévio de remuneração por serviços prestados? Num caso de morte cerebral como se conduzir se a família não autoriza a suspensão do tratamento de suporte? Por outro lado, uma família recusa que seu ente querido vá para a UTI por achar que é estado terminal e prefere tê-lo com os seus no quarto. Como agir?A consulta com um adolescente é superconfidencial, mas em quais situações o assunto poderá ser comentado com os pais? Poderá uma criança a partir dos seis anos ter direito a se submeter a alguns tratamentos em doenças graves de e de prognostico reservado? Se ela recusar pelo sofrimento que isso lhe causará deverá ser respeitada sua vontade? São muitas as situações, vocês nem imaginam.

segunda-feira, 21 de abril de 2014

EM CIMA DO MURO

FERNANDO AZEVEDO

Meu caríssimo colega Ney Cavalcanti escreveu um artigo para a Folha de Pernambuco pedindo para as pessoas saírem de cima do muro e dar a sua opinião. Eu vou passar mais um tempinho em cima dele, somente até o fim dessas linhas, pela formação que tive e pelos próprios conceitos que adquiri na estrada da vida. Os valores materiais não me fascinam. Acho que todas as pessoas deveriam ter o direito à vida digna. Basta isso. Ferraris, iates e ilha de Caras não me seduzem. Educação, moradia, comida no prato e assistência à saúde, nada mais que isso e aquele pouco mais para as curtições de cada um. O mundo, no entanto é guiado pelas cifras, pelos cálculos econômicos e começa a envolver já há algum tempo a venda do próprio corpo, não como prostituição, por exemplo, mas como anatomia. Tivemos exemplos recentes no Recife de pobres que foram para a África do Sul doar rins. Sabe-se do rapto de crianças indefesas para esse fim. Ambos, casos de polícia. Os Estados Unidos com o seu regime capitalista compra sangue e vende os derivados. Aqui a doação é espontânea, através de campanhas humanísticas. Falta sangue. Falta dinheiro no bolso do cidadão, vale à pena ele vender um sanguezinho para levar comida pra casa? Isso é na cifra dos tostões. Vamos para os bilhões de dólares caso da Insuficiência renal que exige hemodiálise por anos. Para zerar a fila dos que precisam transplante renal seriam necessários 50 bilhões de dólares e esse investimento seria compensado com a cessação das hemodiálises, além da evidente melhora na qualidade de vida dos pacientes. Começa então entre os americanos um movimento para incentivar a doação de rim através de “incentivos” tais como aposentadoria precoce, quitação de plano de saúde para o resto da vida ou dinheiro vivo mesmo. Convivi muito com um americano que jogava basquete comigo e ele me falou sobre os jovens requisitados para a guerra no Vietnã e muitos aderiam com a promessa de passar na frente da população comum em aquisição de bens materiais, assistência médica etc. Maioria morreu ou retornou insana mentalmente. Esse amigo contou-me que se fez de louco e foi dispensado. Pode a vida ser regida pelos fatores econômicos? Vejo-me numa mesa de cirurgia dando um rim para um filho se precisasse, mas morreria de vergonha se comprassem alguma coisa minha, um pedaço de pele, metade do desgastado fígado. Quanto vale isso? Como seria a tabela de preços? O mundo realmente sofreu uma transformação que não consigo acompanhar, pois ainda sou vítima do sentimento poético da existência. Sou um anacrônico e não tenho preço. Não façam ofertas.

segunda-feira, 14 de abril de 2014

NÃO E PRONTO

Sempre digo aos meus filhos que “educar um filho” é tarefa difícil. De qualquer forma, com erros confessos, acho que acertei mais que errei e estão ai os três já com suas famílias e todos com ficha limpa. Uma coisa difícil a influenciar a educação é a cultura de cada povo ou mesmo exemplificando simplesmente Pernambuco, diferenças de conceitos entre a população da capital e do interior ou se quiser ir para o Rio de Janeiro entre zona norte e zona sul e pior ainda em Brasília antro de maus exemplos e safadezas desde a sua fundação, um local sem ética e sem valores. Leio um artigo exaltando o “modo francês” de educar. Em que consiste o conteúdo principal, vamos a ele. A criança não é o reizinho da casa. Os pais não vivem em função deles, não os acompanham em festinhas infantis ou parquinhos, “em resumo educam, mas conseguem manter a vida adulta, sem transformar suas vidas num play-ground”. Desde que comecem a falar o bonjour, au-revoir, o merci é obrigatório. Comem o que tiver na mesa e não comidinhas especiais para cada um. Não se sujam, não jogam comida no chão  e não fazem birra. Para a psicopedagoga Ceres Araujo (PUC – SP) que morou em Paris as francesas sabem dizer” não e pronto” e não se perdem em longas explicações. Não e pronto! Se houver réplica, a resposta é “não porque sou sua mãe e sei o que é melhor”. ”É na adolescência, quando caberia esticar a conversa que muitos pais exaustos dizem o "não e pronto". São comportamentos invertidos. “A criança precisa ser obediente na infância para na adolescência se tornar um desobediente”. A alimentação tem horários e sempre na mesa. Esse é um ponto que debato muito com meus clientes e não há forma de entender de outro jeito. Cadeirão, logo que possível, sem TV, sofá e aviãozinho pelo amor de Deus. A criança passa por fases de ótimo apetite e de inapetência e isso deve ser entendido e se ela estiver bem nenhuma preocupação. A hora de dormir é uma disciplina importante e se começa mal é duro mudar. Os franceses não dão folga aos bebês e se chorarem à noite pelo menos 10 minutos de espera até ver o que precisa. Ceres afirma que copiamos o modelo americano e vivemos num “filharcado” onde o filho é soberano.
Ta vendo como é complicado? Que modelo você prefere? Uma coisa do dia-a-dia são os casais separados e quase sempre num litígio permanente. Um diz não e o outro sim, com um pode e com o outro não pode. Entram os avós na arena e a confusão aumenta com as discordâncias. Minha educação foi do modelo rígido (alemão ou francês), com disciplina pra tudo e hora marcada para chegar e sair. Na adolescência tive minhas vitórias ao chegar em casa ao amanhecer com Dr. Rinaldo me procurando pelas ruas do Espinheiro. As ordens dele de chegar cedo eu cumpria rigorosamente e lá pelas seis e meia estava chegando. Adorava a noite a boemia e o violão, mas estava formado o homem com a disciplina e responsabilidade para uma vida adulta. O negócio é complicado.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

JULGAMENTO DE ARTE: TAREFA COMPLICADA.



FERNANDO AZEVEDO 

Ser entrevistado pelas páginas amarelas da Veja não é para qualquer um. Na edição de 12 de Março de 2014 ocupa as páginas Ralph Camargo e no destaque a seguinte frase: MEDIOCRIDADE VIROU GENIALIDADE. Ele é paulista, tem 70 anos e domina com seus conhecimentos o mercado das obras de arte, sobretudo pintura. Eu nunca me arrisquei com pincéis tintas e telas embora amigos meus pintores digam que se aprende. Eu não acredito. A mesma coisa é com a música. Contratei professores de violão para três dos meus filhos e o segundo quando chegava à aula o professor dava um dinheiro para ele para ir tomar um sorvete. Veja que talento! Interrogado a respeito de Romero Brito, Ralph Camargo diz o seguinte: ”para mim ele é apenas um comerciante e do ponto de vista artístico um embuste”. Conheço as galerias de Romero Brito em Miami onde vive e na Rua Oscar Freire, a rua mais cara de São Paulo. Não são lojinhas, são espaços enormes e não tenho nem ideia de quanto custa aquele aluguel. No jornal de hojer (4/4/14) está a noticia que Romero comprou um grande terreno em Miami para construção da sua nova galeria. Vejo a obra dele em malas de viagens e outros objetos. Tenho uma amiga que é uma grande pintora e rotula-o como um decorador e como pintor uma porcaria. Paulo Coelho, o maior vendedor de livros do Brasil e um dos mais traduzidos no mundo é tido também como um embuste e realmente não consegui terminar um livro dele, único que tentei. Na música em todos os tempos e desde o erudito ao popular existe a controvérsia. Considero o Brasil atual como possuidor da pior produção musical. Os destaques são os funkeiros, rappers e outros inqualificáveis que ocupam tos os espaços. Aqui cabe bem o título que MEDIOCRIDADE VIROU GENIALIDADE. Sabemos que em toda atividade o marketing é fundamental, a promoção e ocupação de espaços em todas as mídias para vender o produto é muito importante, mas como pode se comprar ou ouvir coisas tão ruins! Lógico que nada ficará, vai tudo para o lixo não reciclável, esgoto mesmo,  e apagam-se décadas de músicas e  letras da melhor qualidade. Tá difícil!