segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

O GALO DA MADRUGADA E OS CAMAROTES

FERNANDO AZEVEDO

Vejo nos jornais que a Rede Globo não colocará mais seu camarote de famosos na Praça da Independência. Notícia boa. Nem debaixo de cacete eu iria se recebesse um convite, porque não tem nada com o carnaval e muito menos com o Galo. Um dia chego ao consultório e encontro sobre minha mesa um pacote com uma fantasia de árabe, uma sandália de couro e um bilhete de Enéas, meu querido Neinha obrigando minha presença no primeiro desfile após a fundação. Coisa de maluco, mas cumpri a determinação não sem antes impor a presença de um amigo querido Jota Passos para me acompanhar e lógico tomando uma lapadas matinais pra animar. Não éramos mais de 70 pessoas, uma orquestra a pé, uma caminhonete com um barril de chope abastecendo e tirando a sede de caminhantes frevantes que desfilavam num dia normal de trabalho na cidade do Recife para espanto geral da população. Foi bom demais. Ano seguinte aumento meu grupo, tornei-me diretor, e compus com Fernanda Aguiar o Frevo do Galo eu fazendo a letra e ela a música. Acorda Recife acorda que já é hora de estar de pé, e o Galo saia na madrugada mesmo. Mais uma orquestra a pé, mais outra e lá vem à reclamação dos músicos que levavam muita pancada na boca, pois o Galo cada dia tinha mais gente. Veio a solução: tocar em cima de caminhões tipo pau-de- arara com um toldo. Vários diretores foram contra, mas voto vencido. Era pouco ainda e vieram os trios elétricos e em seguida os GIGANTESCOS trios elétricos. A Rua da Concórdia já não cabia e há quatro anos tem o percurso modificado. Neinha dizia que o sucesso do Galo era devido à praga que roguei numa composição também com Fernanda A PRAGA DO GALO gravada por André Rio onde eu dizia que quem não quer sair no Galo tem dez anos de azar. Começa então a frescura de camarotes de famosos que tem cabeleireiros, massagistas, lounge, petiscos e boca livre. Nada contra aluguel de casas e escritórios onde se monta uma estrutura e reúnem-se amigos, mas o tal do camarote é inaceitável e insuportável porque nada tem de carnavalescos nem de carnaval. Não precisamos de importação de ninguém também porque vira carnaval baiano que nada tem a ver com o carnaval pernambucano. Então parabéns à Rede Globo pela decisão, pois da exemplo a outras empresas de mordomia que espero copiem o gesto. Carnaval tem que ter cheiro de gente e não de madames perfumadas. Entendo que não pode o Galo da Madrugada voltar ao passado de orquestras no chão. As mudanças são necessárias, ajustadas a cada tempo, mas explorando a riqueza dos nossos ritmos e o valor dos nossos artistas. O Galo esse ano homenageia Carlos Fernando um revolucionário carnavalesco e grande figura além de excelente compositor. Isso casa com o ideal de Enéas Freire a quem o Recife deve e não paga o que ele fez por nosso carnaval. Para ele compus o PALACIO DO GALO: Enéas Freire vem ver teu palácio/ tá muito lindo nesse carnaval/ foi um presente que tu deste ao Recife/ e na cidade não tem nada igual. É amarelo de amor/ e elo de união/ entre teus filhos nessa multidão/que são palhaços pierrôs e fantasias mil/ de toda parte desse meu Brasil. Viva o Galo, e o carnaval fora dos camarotes.
PS – passou-me pela cabeça quando o Galo modificou o percurso fundar o SAUDOSOS DA CONCÓRDIA para o pré-carnaval. Não tenho tempo, nem dinheiro e nem sei pedir o vil metal. Mas repertório tinha todos em paródia de clássicos do carnaval. Ficou no sonho, nas nuvens.

Nenhum comentário:

Postar um comentário